Fertilização in vitro é ligada à hipertensão; entenda riscos

Quando a gravidez por método natural de concepção não é possível, uma das opções mais adotadas é a fertilização in vitro. Feito o procedimento, a gestante, como qualquer outra, não pode abrir mão do pré-natal. E nesse acompanhamento, a pressão arterial deve estar entre os indicativos prioritários, sinaliza uma equipe de cientistas da Noruega.

Isso porque, ao analisar dados de mais de 6,5 milhões de mulheres, eles constataram que a transferência de embriões congelados pode aumentar em 74% o risco de desenvolvimento de pressão alta na gravidez, em comparação a gestações com embriões frescos ou concepção natural. Considerando apenas o uso de embriões congelados e a gravidez sem intervenção médica, o risco da complicação é duas vezes maior.

Os pesquisadores ainda não conseguem explicar como o congelamento está associado a um maior risco de hipertensão na gravidez. Segundo Sindre Petersen, doutorando da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia, a falta de dados sobre o tipo de ciclo congelado pode ter dificultado a equipe a identificar qual parte da transferência pode ser responsável pela maior vulnerabilidade.

Uma hipótese levantada pelo grupo está ligada ao corpo lúteo, estrutura endócrina temporária que é formada a partir dos restos do folículo ovariano após a ovulação. “Em ciclos de congelamento programados, a formação do corpo lúteo é ignorada por completo, enquanto em ciclos frescos e de concepção natural, ele secreta hormônios vasoativos que podem ser importantes para a adaptação materna à gravidez”, diferencia Petersen. Dessa forma, a ausência de corpo lúteo acaba dificultando a implementação da placenta, e isso impede o desenvolvimento do feto e o prosseguimento da gestação.

O pesquisador afirma que essa teoria ainda precisa ser estabelecida, e que há outras características do processo de transferência de embriões congelados que podem estar ligadas ao fenômeno. “Por exemplo, alterações epigenéticas associadas à criopreservação ou ao descongelamento”, indica o principal autor do estudo, divulgado na revista Hypertension, da Associação Americana do Coração.

Na avaliação de Alvaro Ceschin, ginecologista e presidente da Associação Brasileira de Reprodução Assistida (SBRA), a forma de preparar o útero pode levar à pressão alta, e não o fato de o embrião ser congelado: “Quando a fertilização in vitro utiliza embriões congelados, é feito o chamado ciclo programado com manuseio de estrogênio para preparar o útero para receber o embrião. E a própria placenta já produz muita progesterona e estrogênio, que pode resultar em um descompasso na circulação, levando à pressão alta. Por isso, o manuseio de mais hormônios para estimular um ciclo ‘artificial’ pode aumentar esse risco”.

Perfis variados

A equipe analisou registros médicos de nascimentos na Dinamarca, Suécia e Noruega entre 1988 e 2015. A análise abrangeu quase 2,4 milhões de mulheres com idade entre 20 e 44 anos que deram à luz durante o período analisado. Foram incluídas informações de 4,5 milhões de gestações, das quais 4,4 milhões foram concebidas naturalmente, 78 mil, por transferência de embriões frescos, e cerca de 18 mil geradas por embriões congelados.

Também foram incluídas 33 mil gravidezes de mulheres que tiveram filhos por mais de um dos métodos de concepção. Com esses dados, a equipe pôde verificar se o risco maior de ocorrência de pressão alta estaria ligado a fatores relacionados aos pais, o que não apareceu na análise. As mulheres que deram à luz tinham idades médias distintas: 34 anos (transferência de embriões congelados), 33 anos (embriões frescos) e 29 (gravidez espontânea).

Fator idade

Para a ginecologista Lauriene Pereira, o risco de hipertensão está mais relacionado a fatores pessoais, principalmente da mãe, do que ao processo de congelamento em si. “O estudo mostra que as mulheres que passam por transferência de embriões congelados são mais velhas, faixa etária que tem maior disposição à inflamação. Outro fator, que não está explícito, mas precisa ser considerado, é que os países escolhidos para fazer o estudo são lugares em que a infertilidade está muito relacionada ao sobrepeso”, opina.

Carlos Rassi, cardiologista do Hospital Sírio-Libanês de Brasília, também chama a atenção para o fator idade. “O estudo revela que uma melhor orientação sobre o procedimento mais propício para cada gestação pode evitar complicações, sobretudo em mulheres mais velhas. É necessário que as mães sejam informadas sobre os possíveis riscos das transferências por embriões congelados. Sendo essa uma escolha de procedimento mais consciente, elas podem optar por não fazer”, diz.

Essa prática é justamente o que o principal autor do estudo pretende com o trabalho. “Nossa pesquisa destaca a importância da tomada de decisão clínica compartilhada. Estou muito confiante de que uma boa decisão de optar por uma transferência de embriões frescos ou congelados pode ser tomada após o diálogo entre as pacientes e seus médicos”, enfatiza Petersen. “Além disso, acreditamos que nosso estudo destaca que é necessária uma consideração cuidadosa de todos os benefícios e danos antes de congelar todos os embriões como rotina na prática clínica.”

Fonte: Correio Braziliense- Alice Groth *Estagiária sob a supervisão de Carmen Souza

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