Teste de Covid em casa ajudaria no controle da pandemia no Brasil, dizem especialistas

SÃO PAULO e RIO — A nova onda de Covid-19 ocasionada pela variante Ômicron, altamente contagiosa, tem causado superlotação dos locais que realizam testes para a detecção da doença, como Unidades Básicas de Saúde (UBS), pronto socorro de hospitais, laboratórios e farmácias das grandes cidades. Usados para desafogar os sistemas de saúde e agilizar os diagnósticos nos Estados Unidos e em muitos países da Europa, os autotestes —exames rápidos de antígeno que podem ser feitos em casa por qualquer paciente — não têm seu uso aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Especialistas ouvidos pelo GLOBO afirmam que esse tipo de teste poderia ajudar no controle da pandemia e já deveria estar disponível no país há muito tempo.

— Seria muito bom, tanto por uma questão de vigilância quanto para isolamento, se pudéssemos distribuir testes na casa das pessoas e elas testassem no primeiro sintoma, com resultado rápido e autoexplicativo — diz o infectologista Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim).

Nos EUA e na Europa, esse tipo de teste está disponível desde o ano passado. Em alguns lugares, é possível comprá-lo na farmácia, sem receita médica. Em outros, ele é disponibilizado gratuitamente pelo governo.

— Essa estratégia é chamada de vigilância participativa. Tem experiência disso em vários lugares. No Brasil, a fabricante poderia fazer um acordo com o Ministério da Saúde e, com um simples QR Code na embalagem, a pessoa seria direcionada para uma página onde ela informa o resultado do teste — diz o epidemiologista Wanderson de Oliveira, ex-secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde.

No Reino Unido, basta fazer a solicitação pela internet ou passar em uma farmácia e retirar os testes gratuitamente. Se o resultado for positivo, o usuário deve se isolar e relatar às autoridades sanitárias. Cingapura começou a enviar seis kits de teste rápido para todas as famílias em setembro. Na França, é possível comprar o autoteste em supermercados.

No Brasil, estão disponíveis apenas autotestes rápidos para gravidez e diabetes. Uma resolução de 2015 da Anvisa afirma que “não podem ser fornecidos a usuários leigos produtos de autoteste que têm como finalidade testar amostras para a verificação da presença ou exposição a organismos patogênicos ou agentes transmissíveis, incluindo agentes que causam doenças infecciosas passíveis de notificação compulsória”.

Como ele funciona

O autoteste é um exame rápido de antígeno, semelhante ao disponível em farmácias: com um swab, o paciente coleta secreção nasal ou pela saliva e depois mistura a uma solução que vem no kit. O diagnóstico é revelado em poucos minutos e indica se a pessoa está com uma infecção ativa.

Uma das críticas em relação a esse tipo de teste é sobre a precisão do diagnóstico.

— Se a coleta não for feita adequadamente, pode comprometer o resultado do exame. Além disso, esse exame não tem a mesma precisão dos outros testes. Ter um resultado negativo não significa que a pessoa não está infetada e, com base nesse resultado, ela pode não se isolar, relaxar e disseminar a doença — explica Chrystina Barros, pesquisadora em saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Um estudo recente feito por pesquisadores da Covid-19 Sports and Society Working Group sugere que dois autotestes caseiros amplamente utilizados nos EUA podem falhar na detecção da Ômicron, mesmo quando as pessoas estão com uma carga viral alta.

Por outro lado, para o infectologista Leonardo Weissmann, do Instituto Emílio Ribas e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), a possibilidade de resultados falsos negativos não é motivo para não regulamentar o acesso universal ao teste.

Para evitar equívocos, é consenso entre os especialistas a necessidade de educar e dar suporte à população ao implementar essa estratégia.

— Estamos em um momento que exige testar o máximo possível. A autotestagem poderia ajudar a identificar mais casos e reduzir a transmissão — diz Weissmann.

Para o epidemiologista Pedro Hallal, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), a discussão sobre os autotestes chega ao Brasil com um ano e meio de atraso:

— Quando era para estar investindo em testagem, o Brasil gastava dinheiro público com cloroquina e outros medicamentos que não servem para nada ao enfrentar a Covid-19.

Comments are closed.

This website uses cookies to improve your experience. We'll assume you're ok with this, but you can opt-out if you wish. Accept Read More

Privacy & Cookies Policy