
BRASÍLIA — O presidente Jair Bolsonaro sancionou uma lei que autoriza a inclusão no Sistema Único de Saúde (SUS) de medicamentos com indicação de uso diferente da aprovada no registro da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o que é chamado de uso off label. A medida vale desde que haja recomendação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec).
Terão que ser demonstradas “as evidências científicas sobre a eficácia, a acurácia, a efetividade e a segurança” do remédio. A sanção foi publicada nesta terça-feira no Diário Oficial da União (DOU). Também ficaria autorizada a inclusão de medicamentos recomendados pela Conitec e adquiridos por intermédio de organismos multilaterais internacionais.
A Conitec é vinculada ao Ministério da Saúde e conta com integrantes da pasta, do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), da Anvisa e do Conselho Federal de Medicina (CFM), além de consultores externos.
Até o momento, a Lei Orgânica da Saúde proibia em todas as esferas do SUS “o pagamento, o ressarcimento ou o reembolso de medicamento” sem registro na Anvisa. A nova lei acrescenta as duas exceções.
Um dos exemplos mais conhecidos de uso off label foi o da cloroquina no tratamento da Covid-19, estimulado por Bolsonaro. Nesse caso, no entanto, a Conitec contraindicou o uso para pacientes internados ou em atendimento ambulatorial. A cloroquina é comprovadamente ineficaz contra a doença.
O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, elogiou a sanção da lei, agradecendo o Congresso Nacional pela aprovação. Segundo o cardiologista, a inclusão de medicamentos com indicação fora da bula no SUS é uma “demanda antiga” da pasta e, agora, representa “um grande avanço para saúde pública brasileira”.
“A aprovação desta lei era uma demanda antiga do @minsaude e ampliará o acesso a medicamentos fundamentais para as políticas públicas, mas que muitas vezes não são incorporados pela falta de interesse da indústria farmacêutica em solicitar a alteração do bulário à Anvisa”, escreveu o ministro, nas redes sociais.
O texto sancionado também define que a avaliação econômica realizada para a inclusão de novos medicamentos no SUS deverá ter metodologias “dispostas em regulamento e amplamente divulgadas, inclusive em relação aos indicadores e parâmetros de custo-efetividade utilizados”.
A avaliação econômica é um dos critérios utilizados pela Conitec, que precisa fazer uma comperação dos custos e benefícios das tecnologias já utilizadas no SUS.
Outra alteração é, durante o processo na comissão, os pedidos terão “distribuição aleatória”, mas “respeitadas a especialização e a competência técnica requeridas para a análise da matéria”. Também deverá haver a publicidade dos atos processuais.
O projeto de lei é de autoria do ex-senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) e tramitou no Senado entre 2015 e 2021. Inicialmente, no entanto, o texto tratava apenas dos processos internos da Conitec, sem referência ao fim da obrigatoriedade da indicação da Anvisa.
Esse trecho foi incluído pelo último relator do projeto, o senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), que na época era líder do governo no Senado, e foi mantido pela Câmara.
— No atual cenário da pandemia de Covid-19, tal medida permitirá, por exemplo, eventuais avaliações da Conitec para medicamentos que vêm apresentando evidências científicas de qualidade para o tratamento da doença, como é o caso da dexametasona, um corticoide que tem se mostrado capaz de reduzir significativamente o risco de morte em pessoas intubadas — afirmou Bezerra durante a votação da proposta,
Mudança pode aumentar riscos, diz agência
Em nota, a Anvisa disse que “respeita o processo legislativo”, mas ressaltou que “a aplicação da nova lei necessita de ações robustas do poder público para reduzir os riscos aos pacientes”.
A agência disse que a aplicação de remédios fora da indicação “pode resultar em aumento dos eventos adversos não conhecido” e que por isso será necessário “um rígido controle e monitoramento”.
Além disso, informou que “estuda a adoção de medidas regulamentares para fins de monitoramento, visando a proteção da saúde pública”.