
Dificuldade em fazer planos, exibir autocontrole e manter o foco estão entre os sintomas de um subtipo de depressão recém-identificado. Pesquisadores descreveram o quadro em estudo publicado em 15 de junho no periódico JAMA Network Open.
O subtipo, chamado “biótipo cognitivo”, não pode ser tratado de forma eficaz pelos antidepressivos comumente prescritos, que aumentam no cérebro a concentração da serotonina (neurotransmissor atrelado ao bom-humor, à sensação de felicidade e ao sono regular). Por isso, os cientistas acreditam que, como alternativa, outros tratamentos e drogas menos usadas poderiam aliviar os sintomas dessas pessoas.
Pesquisadores da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, testaram três dos antidepressivos amplamente prescritos em 1.009 adultos com transtorno depressivo maior que nunca haviam sido medicados anteriormente. Os fármacos testados foram: escitalopram (também conhecido pelo nome comercial Lexapro) ou sertralina (Zoloft), que atuam na serotonina; ou o venlafaxina-XR (Effexor), que atua na serotonina e norepinefrina.
Ao longo de oito semanas, 712 participantes completaram o regime de medicações. Antes e depois do tratamento com os antidepressivos, os sintomas deles foram medidos por meio de duas pesquisas: uma administrada por um médico e outra em formato de autoavaliação, com questões de mudanças no sono, alimentação, operação social, qualidade de vida, etc.
Antes do tratamento medicamentoso, os cientistas fizeram uma ressonância magnética funcional (RMF) em 96 dos participantes enquanto eles realizavam uma tarefa “GoNoGo” com uma tela. Esta atividade exige que os pacientes pressionem um botão o mais rápido possível quando virem “Go” em verde e não pressionem quando enxergarem “NoGo” em vermelho.
A técnica permitiu rastrear a atividade neuronal medindo as mudanças nos níveis de oxigênio no sangue, que mostraram o funcionamento em diferentes regiões do cérebro correspondentes às respostas “Go” e “NoGo”. Os cientistas então compararam as imagens obtidas com as de indivíduos sem depressão.
Os participantes com depressão também completaram testes cognitivos antes e depois do tratamento, medindo memória verbal, memória de trabalho, velocidade de decisão e atenção sustentada, entre outros aspectos.
Subtipo é detectável no cérebro
Os pesquisadores identificaram que 27% dos pacientes sofriam do “biótipo cognitivo”, com sintomas mais proeminentes de lentidão cognitiva e insônia, função cognitiva prejudicada em testes comportamentais, bem como atividade reduzida em certas regiões frontais do cérebro.
A RMF feita antes do tratamento com antidepressivos mostrou que os voluntários com esse subtipo de depressão tinham menor atividade nas regiões cerebrais do circuito de controle cognitivo durante a tarefa “GoNoGo”, em comparação com os participantes que não tinham essa subclasse de depressão.
O circuito de controle cognitivo é responsável por limitar pensamentos e respostas indesejáveis ou irrelevantes e melhorar a seleção de metas, entre outras tarefas. Ele é formado por duas áreas do cérebro: o córtex pré-frontal dorsolateral e as regiões cinguladas dorsais anteriores.
Após o tratamento com os antidepressivos convencionais, as taxas de remissão dos sintomas foram de apenas 38,8% para os participantes com o biotipo recém-descoberto e de 47,7% para aqueles sem ele. Essa diferença foi mais proeminente para a sertralina, para a qual as taxas de ausência de sintomas foram de 35,9% e 50% para aqueles com e sem o subtipo de depressão, respectivamente.
“A depressão se apresenta de maneiras diferentes em pessoas diferentes, mas encontrar semelhanças – como perfis semelhantes de função cerebral – ajuda os profissionais médicos a tratar os participantes de maneira eficaz, individualizando o atendimento”, afirma Leanne Williams, autora sênior do estudo, em comunicado.
Outro medicamento, a guanfacina, que visa a região específica do córtex pré-frontal dorsolateral, está sendo estudada por pesquisadores do Stanford Center for Precision Mental Health and Wellness, que Williams dirige, em parceria com a Clínica de Saúde Mental Stanford Translational Precision.
Esse tratamento pode ser mais eficaz para pacientes com o subtipo cognitivo. Os pesquisadores esperam não só testar mais pacientes com o quadro como também comparar diferentes tipos de susbtâncias com tratamentos não medicamentosos de estimulação magnética transcraniana e terapia cognitivo-comportamental.
“Eu testemunho regularmente o sofrimento, a perda de esperança e o aumento da tendência suicida que ocorre quando as pessoas estão passando por nosso processo de tentativa e erro”, conta Laura Hack, principal autora do estudo. “É porque começamos com medicamentos com o mesmo mecanismo de ação para todos com depressão, embora a depressão seja bastante heterogênea. Acho que este estudo pode ajudar a mudar isso.”
Fonte: Revista Galileu