
Duas crianças sofreram de mutações genéticas raras que as fizeram ter um apetite “insaciável”, resultando em obesidade grave. Os casos foram relatados por médicos em estudo publicado na quarta-feira (14) no periódico The New England Journal of Medicine.
O estudo, financiado pela Fundação Alemã de Pesquisa (DFG), relata que um menino de 14 anos e uma menina de 2 anos de idade, que não são parentes, tinham diferentes mutações genéticas que perturbam a leptina, um hormônio que participa da regulação da fome.
Ao contrário da grelina, conhecida como “hormônio da fome” — cujos níveis variam conforme jejuns e a ingestão de alimentos — a leptina permanece relativamente estável, estando relacionada à quantidade de gordura branca no corpo.
Segundo o site Live Science, a leptina informa ao corpo quanta energia ele armazenou em gordura branca e ativa o “modo de fome” quando esses estoques caem muito. Depois que as células de gordura produzem o hormônio, ele se conecta ao tronco cerebral e ao hipotálamo, regiões do cérebro que ajudam a controlar o apetite.
Mutações genéticas que interferem na produção de leptina são raras, sendo que anteriormente os cientistas haviam encontrado 21 variantes genéticas que mexiam com a produção, liberação ou sensibilidade do hormônio, resultando na “fome insaciável”, condição conhecida como hiperfagia.
Pacientes
A equipe de médicos responsável pelo estudo, que inclui especialistas do Centro Médico da Universidade de Ulm, na Alemanha, detalha que a menina e o menino tinham altos níveis de leptina no sangue, o que coincidia com seus altos percentuais de gordura corporal.
Após descartarem hipóteses de que os pacientes sofriam das síndromes de Prader-Willi e Bardet-Biedl, que podem levar a um aumento do apetite e ganho de peso na infância, os cientistas descobriram que as crianças carregavam mutações ligeiramente diferentes.
Cada uma delas tinha uma variante diferente do gene da leptina (LEP). O menino tinha uma versão apelidada de P64S e a menina a versão G59S, sendo que as duas codificavam versões modificadas do hormônio.
Por meio de estudos de laboratório com células humanas, os pesquisadores testaram quão bem a leptina das crianças se ligava ao receptor que normalmente se conecta no cérebro. Ambas as versões do hormônio ligaram-se ao receptor, mas desencadearam uma sinalização marginal ou nenhuma sinalização.
Na presença de leptina normal, as versões variantes bloquearam o receptor e não permitiram que a leptina normal se conectasse. Assim, embora as crianças produzissem grandes quantidades do hormônio modificado, este não conseguia sinalizar ao cérebro que seus corpos continham muita energia armazenada. Sem esse sinal, o apetite das crianças não poderia ser saciado.
Para resolver o problema, os médicos trataram o menino e a menina com metreleptina, uma forma sintética de leptina. Os pacientes precisaram de “doses mais altas do que o normal” do tratamento para superar os efeitos de suas variantes no cérebro.
As crianças também passaram por programas de jejum e exercícios para ajudar a reduzir a gordura branca e a produção de leptina. Ambos os pacientes eventualmente atingiram peso quase normal, obtendo uma normalização da ingestão de alimentos e saciedade.
De acordo com os médicos, anticorpos contra a metreleptina “se desenvolveram nos pacientes, embora não tivessem nenhum efeito aparente na eficácia” do tratamento. Não houve efeitos colaterais graves observados nas crianças.
Fonte: Revista Galileu