A polarização da busca pela vida saudável

O primeiro tuno das eleições chancelou o que se vê nas ruas há alguns anos: a polarização no cenário político no Brasil. Os dois candidatos à presidência do Brasil que disputarão o segundo turno somaram juntos mais de 90% do total de votos, sendo que a diferença entre eles foi um pouco maior do que 5%. O mesmo aconteceu na maioria dos estados brasileiros, em que a disputa se acirrou entre os dois primeiros colocados
O mesmo fenômeno ocorre no estilo de vida saudável: é oito ou oitenta. Direita ou esquerda. Sim ou não. 13 ou 22. Bom ou ruim.
Diariamente, recebo no meu consultório pacientes que passaram por experiências traumáticas com dietas e nutricionistas, histórico de restrição e privação.
Certa vez, estava hospedada em um hotel e desci para o café da manhã, uma das melhores partes de qualquer viagem na minha opinião: mesa farta e variada. Ao sentar, observei ao lado um casal, constrangido, abrir suas marmitas com batata doce e ovo cozido. Aquela cena me fez refletir qual o preço que estamos dispostos a pagar pela perda de peso ou pelo shape dos sonhos. Uma coisa é a disciplina, o foco, o planejamento. A outra é poder aproveitar o que eu chamo de evento. Será que a batata doce não poderia ser substituída pelo pão integral? Os ovos cozidos pelos mexidos?
Vejo que algumas pessoas desenvolvem medo de alguns nutrientes, o que eu chamo de “carbofobia” (o medo do carboidrato). Retiram pão, macarrão, arroz e batata, acreditando serem esses os alimentos responsáveis por engordar ou emagrecer. Outro medo muito comum é o da gordura. Excluem quase totalmente o óleo do consumo diário. Num primeiro momento, essas estratégias funcionam, o paciente emagrece e atinge o objetivo pretendido. Porém, depois de um período restritivo, de monotonia alimentar, o indivíduo não aguenta e escorrega: vai a uma pizzaria e adeus dieta. Uma escapada é o gatilho para abandonar a adoção da alimentação saudável e voltar aos antigos hábitos ou pior, passar a comer descontroladamente, apresentando um reganho de peso e alcançando um peso maior do que tinha antes da dieta.
Observo o mesmo fenômeno com os suplementos alimentares. Há pacientes que tomam tantas cápsulas, pós e shots em horários, doses e objetivos errados que não consigo compreender o raciocínio fisiológico de quem prescreve. Muitos deles assistem a vídeos em redes sociais de influenciadores sem formação que atestam a eficácia e prometem o corpo dos sonhos. São esses mesmos pacientes que ingerem álcool quase todos os dias, não comem frutas, verduras, legumes e acreditam que a pílula mágica trará a saúde perfeita.
A atividade física é outro fator que leva as pessoas ao extremismo. Há aqueles que se matriculam na academia em busca do corpo ideal e passam a fazer exercício físicos diariamente, às vezes mais de 2, 3 horas ao dia. Saem do sedentarismo e desenvolvem quase uma vigorexia, doença psicológica caracterizada pela preocupação constante em não ser suficientemente musculoso.
Faz parte da minha conduta clínica orientar a prática de exercícios, enumero os benefícios de mexer o corpo tanto para o físico, mas principalmente para a saúde mental e social. Para isso, não é necessário estar dentro da academia: comece a caminhar 20 minutos por dia, pelo menos 3 vezes por semana, e vá aumentando aos poucos, tanto no tempo de exercício, quanto na frequência.
A terceira via não emplacou nessas eleições e vejo também uma grande dificuldade em emplacar no estilo de vida saudável. Porém, o segredo da vida saudável é o equilíbrio, o meio-termo. Não se cobre por não fazer 100%, ninguém faz! Exagerou em uma refeição? Reequilibre na próxima, coma menos. Não conseguiu se exercitar nesses dias? Não desanime, tente ir à padaria a pé ou substitua o elevador pelas escadas. O que importa é voltar para o caminho em direção à longevidade.
Fonte: O Globo